terça-feira, 22 de novembro de 2011

Concordância do Novo Testamento sahídico

Mais uma contribuição do meu amigo Alin Suciu; ele disponibilizou a concordância do Novo Testamento sahídico em quatro arquivos pdf no seu site.
Uma ótima ferramenta para quem se interessa pelo estudo do copta.
A versão sahídica do Novo Testamento é uma das mais antigas que conhecemos. O sahídico era um dos dialetos coptas do sul do Egito
Quem se der ao trabalho de dar uma olhada no site do Alin, já recomendado nesse blog, vai encontrar vários outros arquivos interessantes em pdf.  Muita coisa boa para quem se interessa pelo cristianismo egípcio, pelo copta e pelo árabe.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Sola scriptura: a construção e a transmissão do texto bíblico.

Antes de tudo, quero deixar claro que esse post não pretende ser ofensivo em relação aos protestantes frequentadores do blog; na verdade, não pretende ser ofensivo em relação a ninguém. Quero somente tecer algumas considerações sobre o princípio da sola scriptura e a construção e transmissão do texto bíblico. Resolvi escrever sobre o assunto porque vi que o termo "Reforma Protestante" está hoje entre os TT's no Twitter, aparentemente por se tratar do aniversário do episódio em questão.
Até onde sei, o princípio em questão não nega totalmente a Tradição; ele diz somente que a Bíblia tem primazia sobre  a própria Tradição e que havendo divergências entre ambas, vale o que está escrito nas Escrituras. No entanto, outros movimentos protestantes, considerados, via de regra, mais radicais criaram o princípio da Nuda scriptura, negando completamente a Tradição e considerando que a Bíblia pode ser interpretada por si só.

Falemos primeiramente da Nuda scriptura. Me desculpem os que pensam o contrário, mas tal princípio é insustentável. Um texto para ser bem interpretado precisa ser considerado em seu contexto. Mesmo que se acredite que as Escrituras sejam divinamente inspiradas, não há como negar que elas foram compostas utilizando uma linguagem humana, inserida na história. Além do mais,
a Tradição é responsável pela conservação, compilação e transmissão das Escrituras. Sem a Tradição, não haveria Novo Testamento.

Às vezes tenho a impressão de que querem que eu acredite que alguém, no séc. I, reuniu o Novo Testamento num códice, entrou numa máquina do tempo e viajou até o séc. XVI, entregando o códice em questão aos reformadores. Ora, sabe-se que o fragmento mais antigo conhecido do Novo Testamento, um extrato do Evangelho de João - pertencente à coleção de Papiros Rylands  - data provavelmente do início do séc. II. Não há manuscritos neo-testamentário mais antigos do que isso. Sabe-se, por exemplo, que no início do séc. II, a Igreja primitiva já havia se organizado segundo a hierarquia episcopal. De qualquer forma, os códices completos de textos bíblicos mais antigos datam todos do séc. IV - como os códices Sinaiticus e Vaticanus, por exemplo -  época em que, sem dúvida, a Igreja já estava hierarquicamente e dogmaticamente organizada. Esses códices são ferramentas indispensáveis para o estabelecimento do texto grego do Novo Testamento. E esses códices do séc. IV foram, obviamente, conservados pela tradição das Igrejas cristãs primitivas. Se não houvesse Tradição, esses textos não teriam sido conservados. Por isso, caro leitor do blog, é sempre bom perguntar: a tradução do seu Novo Testamento se baseia em qual texto Grego? Em qual códice?

No mais, sem a Tradição nós não seriamos capazes nem de afirmar quem são os autores dos Evangelhos, por exemplo, já que não há menção alguma de seus autores nos próprios textos. Os títulos que atribuem as autorias a Mateus, Marcos, Lucas e João são obra de editores da antiguidade tardia, que se basearam, obviamente, na Tradição para adotar tal atribuição.


Em relação ao princípio da Sola scriptura, gostaria apenas de dizer que não me lembro de casos em que a Tradição contradiga as Escrituras. Muito pelo contrário, a Tradição, habitualmente, elucida as Escrituras, interpretando-a e explicando por meio de pessoas que estavam mais próximas do contexto de composição dos próprios textos bíblicos.

No mais, é intrigante perceber que o princípio em questão acaba muitas vezes por afastar acadêmicos protestantes do estudo da Patrologia. Mesmo que de maneira inconsciente, muitos estudiosos protestantes, talvez influenciados pela Sola scriptura, ignoram quase que completamente a literatura cristã antiga que não faz parte das Escrituras.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Os sermões perdidos de Agostinho

Não é segredo para ninguém que Agostinho foi o maior escritor cristão da Antiguidade; ninguém deixou um legado literário tão extenso e complexo quanto o bispo de Hipona.
Sabe-se também que volta e meia um ou mais sermões desconhecidos atribuidos a Agostinho  são encontrados em bibliotecas européias, em meio a manuscritos medievais esquecidos e não catalogados. Isso demonstra que a incrível produção literária de Agostinho é ainda maior do que imaginávamos. Nada impede que outros sermões "perdidos" sejam encontrados.
Pois bem, hoje tive a oportunidade de assistir uma palestra da Professora Anne Pasquier, da Faculdade de teologia e ciências das religiões da Université Laval, sobre um desses sermões perdidos, o Sermão Dolbeau 26. A professora mencionou por alto o achado de cerca de 20 novos sermões atribuidos a Agostinho na Alemanha em 2008, em manuscritos do séc. XII. O próprio Sermão Dolbeau 26 foi achado também na Alemanha em 1990, em meio a cerca de 60 sermões inéditos igualmente atribuidos a Agostinho, num manuscrito provavelmente copiado no séc. XV.
O sermão em questão, ainda segundo a professora, reflete a situação da Igreja africana no início do séc. V; fala basicamente da conversão dos pagãos, em face das proibições legais dos próprios cultos pagãos e do problema donatista, que acabaria por gerar um cisma na cristandade africana em 405. O sermão foi provavelmente composto em 404, à epoca do início do episcopado de Agostinho. 

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Sobre o "daimon" do Evangelho de Judas

Um vídeo de uma palestra sobre o Evangelho de Judas que vi no facebook de um colega esses dias me fez querer rever o documentário feito pela National Geographic sobre o texto em questão. Não consegui revê-lo até o fim, é muita bobagem e mentira juntas num só documentário. Triste mesmo é ver estudiosos renomados contribuindo com isso...
Já escrevi bastante sobre o Evangelho de Judas aqui nesse blog, quem quiser ler mais, pode fazer uma pesquisa ou clicar aqui
Mas enfim, dentre as muitas bobagens e erros divulgados pela National Geographic em relação ao Evangelho de Judas, creio que a mais absurda tenha sido a tradução do termo grego daimon (CT 44, 21). Na primeria edição do texto, publicada logo após o lançamento do próprio documentário, ainda em 2006, o termo em questão foi traduzido para o inglês como "spirit"; a edição brasileira - que, diga-se de passagem, não é uma tradução feita diretamente do copta, mas do inglês para o português - feita pela Ediouro, utilizou o termo "espírito". Os estudiosos da National Geographic justificaram a tradução em questão evocando o daimon de Socrates.
É obvio que o fato de Jesus chamar Judas de "décimo-terceiro demônio" não combinaria com a interpretação que a National Geographic queria enfiar na guelha do leitor, interpretação essa que dizia que o Evangelho de Judas apresentava uma nova imagem de Judas, uma imagem positiva, e uma nova versão para traição. Mas basta ler o texto com atenção para ver que essa interpretação não se sustenta.
De qualquer modo, traduzir o termo daimon num texto cristão como espírito é, no mínimo, inusitado. No conjunto da literatura cristã antiga, o termo é quase sempre - e eu arriscaria dizer sempre - utilizado de maneira pejorativa, negativa, para designar um ou mais demônios. Por que logo no caso do Evangelho de Judas o significado seria diferente? Vale lembrar que o próprio Evangelho de João chama Judas de "diabo" (em grego, diabolos) uma expressão análoga, convenhamos.
Enfim, depois da avalanche de críticas dos outros estudiosos e especialistas, a edição crítica da National Geographic, publicada em 2007, substituiu o termo "spirit" na tradução pelo termo técnico grego, transliterado, "daimon". Na tradução francesa presente na mesma edição e feita por R. Kasser, optou-se por traduzir o termo como "démon" (demônio, em português). No index de termos coptas, feito pelo próprio Kasser, apresenta-se "demônio" como primeiro significado do termo em questão (pág. 343 da edição crítica), sem, no entanto, descartar a possibilidade de traduzí-lo como "espírito", tradução essa que consta no mesmo verbete do mesmo index.
Parece-me, no entanto, não restar dúvidas de que a tradução correta do termo seja mesmo "demônio".   


terça-feira, 13 de setembro de 2011

Textos em copta atribuidos a João Crisóstomo

Para comemorar o dia de São João Crisóstomo na liturgia latina, eis um post no site do meu amigo Alin sobre novos escritos em copta atribuidos a esse notável teólogo e pregador da antiguidade:



terça-feira, 26 de julho de 2011

Ana, a mãe de Maria, e a tradição apócrifa e antiga


A iconografia normalmente representa
Santa Ana com Maria, ainda criança, em
seus braços, ou instruindo-a sobre as
Escrituras judaicas; na imagem acima, ´
vê-se, além de Ana e Maria, Joquim.
Hoje, dia 26 de julho, a Igreja Católica Romana comemora a festa de Santa Ana, considerada pela tradição a mãe de Maria. Santa Ana é também a padroeira do meu querido estado de Goiás, terra da minha mãe.
Os nomes dos avós de Jesus - Ana e Joaquim - ou seja, dos pais de Maria, não são citados nas Escrituras. É óbvio, no entanto, que Maria teve um pai e uma mãe e seus pretensos nomes são citados num apócrifo deveras arcaico chamado de Proto-evangelho de Tiago, também conhecido como Natividade de Maria. O texto é provavelmente uma composição da segunda metade do séc. II, pseudonimicamente atribuido a
Tiago, o irmão de Jesus, e gozou de muita popularidade na antiguidade tardia, tendo sido, inclusive, citado por Padres da Igreja como Clemente de Alexandria, Epifânio de Salamina e Gregório de Nissa. O nome de proto-evangelho se deve ao fato de ele narrar aquilo que teria acontecido antes da concepção e nascimento de Jesus; sendo Jesus a Boa Nova (evangelho), o texto que narra o que precedeu Sua vinda ao mundo e, consequentemente, a própria Boa Nova, é chamado de proto-evangelho. Mas esse título é moderno, todavia; o proto-evangelho narra, grosso modo, a concepção miraculosa e nascimento de Maria, sua infância e seu casamento, daí o nome Natividade de Maria, que é o título que aparece no Papiro Bodmer V, a mais antiga versão conhecida do texto.
O texto em questão é particularmente interessante por ser um dos testemunhos mais antigos - juntamente talvez com o texto conhecido como Ascensão de Isaías - da crença na virgindade perpétua de Maria. Vale lembrar que os evangelhos canônicos dizem que Maria concebeu virginalmente mas não dizem nada a respeito do fato de ela ter ou não continuado virgem. O Proto-evangelho de Tiago demonstra, no entanto, que já no séc. II existiam cristãos que acreditavam nisso.
Não se pode atribuir rigor histórico ao texto em questão, como no caso de todos os apócrifos. No entanto, repito, ele é um testemunho das crenças dos cristãos que o compuseram no séc. II e provavelmente de muitos daqueles que o leram ou o consumiram de algum modo. Assim sendo, não se pode ter certeza de que os nomes dos pais de Maria eram de fato Ana e Joaquim. Mas, como dito anteriormente, é óbvio que Maria teve um pai e uma mãe e a tradição acatou seus nomes preservados e citados no Proto-evangelho de Tiago.
Pode-se encontrar referências ao culto dos santos Ana e Joaquim ainda na antiguidade tardia; o Sermão Sobre a Natividade de Maria, de João Damasceno (séculos VII-VIII) é prova disso. O mesmo sermão reforça a crença na virgindade perpétua de Maria.  
Visão do teto da Catedral de
Sainte-Anne-de-Beupré
Na província de Québec há uma catedral dedicada à Santa Ana, a Catedral de Sainte-Anne-de-Beaupré. Interessante é o fato de no teto dessa catedral estarem pintadas várias imagens narradas no Proto-evangelho de Tiago.                   

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Fontes em siríaco e copta

Mais uma ferramenta para quem trabalha com cristianismo antigo e tem dificuldade para ter acesso a certos livros.
Trata-se do site do Center for the Preservation of Ancient Religious Texts  da Brigham Young University. Na página principal do site em questão há links que disponibilizam para dowload várias fontes e textos antigos - bem como artigos e estudos - principalmente em copta e em siríaco.  
O site disponibiliza ainda explicações sobre os vários projetos da universidade que envolvem o estudo de manuscritos antigos, como, por exemplo, o da Brown Collection e  o de manuscritos siríacos da coleção do Vaticano.
Cortesia do meu amigo Alin Suciu.

terça-feira, 19 de julho de 2011

A (re)descoberta da literatura copta pelo Ocidente

A Igreja egípcia separou-se oficialmente do restante da cristandade em 451, logo após o Concílio de Calcedônia. O cisma em questão foi, por um lado, um triste desfecho de um processo de distanciamento entre a cristandade do Ocidente e do Oriente que já vinha se desenhando desde o séc. IV, e por outro, uma reação, digamos, desproporcional do patriarcado de Alexandria frente à perda de influência política e cultural de sua cidade em relação à Constantinopla. O distanciamento entre os cristãos do Ocidente e do Oriente deveu-se principalmente a elementos linguisticos e políticos. Desde fins do século III, o latim passou a ser a língua dominante entre os cristãos do ocidente; antes disso, o grego predominava mesmo no Ocidente, mas com o passar do tempo, deixou de ser língua corrente nessa região, perdendo espaço para o latim. Do outro lado, no Oriente, o latim nunca chegou a ser uma lígua influente; o grego sempre foi a língua majoritária. Portanto, nas últimas décadas do séc. IV, cristãos do Ocidente e do Oriente falavam, grosso modo, duas línguas diferentes e pessoas como Rufino de Aquiléia e Jerônimo foram praticamente os últimos exemplos de teólogos que dominavam as duas línguas. Politicamente, Alexandria, a cidade cultural por excelência da antiguidade, vinha perdendo cada vez mais espaço para a nova capital do império, Constantinopla, tendência que se desenhava desde 381 com o Primeiro Concílio de Constantinopla.
O fato é que desde o séc. V, a Igreja egípcia ficou praticamente isolada do restante da cristandade. Assim sendo, o periodo de ouro da literatura copta, que, arrisco dizer, vai de Shenoute (fim do séc. IV - início do séc. V) até a invasão muçulmana no séc. VII, desenvolveu-se localmente e não teve repercussão alguma no Ocidente. Só se conhecia a literatura copta indiretamente, por meio de traduções gregas e latinas de regras e vidas monásticas, e mesmo assim só o que havia sido composto antes de 451.
O Ocidente só veio tomar conhecimento da literatura copta e, digamos assim, redescobrí-la no séc. XV quando houve uma tentativa de re-aproximação e união por parte da Igreja Católica Romana com a Igreja Copta. Nota-se nos séculos seguintes um crescente interesse por parte dos orientalistas pela literatura copta; interesse esse que se deveu também ao fato de muitos viajantes e aventureiros retornarem à Europa com manuscritos e fragmentos de textos coptas. As descobertas arqueológicas de manuscritos coptas se multiplicaram nos séculos XIX e XX e a importância da literatura copta para o estudo do cristianismo primitivo foi sendo notada.
Falar mais da importância e do escopo da literatura copta nesse post seria chover no molhado; uma breve pesquisa aqui no blog seria suficiente para se constatar isso.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

São Bento e as origens do monasticismo

Hoje, dia 11 de julho, a liturgia ocidental comemora a festa de São Bento de Núrsia, nascido no dia 24 de março de 480 e falecido no dia 21 de março de 547. São Bento foi um dos mais notórios monges do Ocidente da antiguidade tardia e fundador da ordem que leva seu nome. Foi ainda o autor da famosa regra que também leva seu nome.
No entanto, ao contrário do que muitos pensam, ele não foi o primeiro fundador de uma comunidade monástica ou o primeiro a escrever regras. O fênomeno do monasticismo cenobita é, de fato, bem anterior a Bento e data, pelo menos, da primeira metade do século IV.
Já no final do século III e início do século IV, vários homens se isolaram nos desertos do Egito e da Palestina para viverem uma ascese radical. Um desses anacoretas, Pacômio, fundou, no sul do Egito, na primeira metade do século IV, a primeira comunidade monástica da qual se tem notícia. O fenônemo se espalhou por toda a cristandade ainda no século IV. Pacômio, até onde se sabe, foi também o primeiro a escrever regras monásticas. É muito provável que tais regras tenham chegado a Bento por meio de traduções latinas feitas por São Jerônimo, tendo assim influenciado na redação das famosas regras de São Bento.
De qualquer maneira, o fenômeno monástico é de suma importância para a cristandade e para as civilizações, tanto do Ocidente quanto do Oriente. Os monastérios são responsáveis, por exemplo, pela conservação de uma parcela importante da cultura clássica. Eram, muitas vezes, os únicos locais da antiguidade tardia onde manuscritos estavam protegidos das ordas de bárbaros que invadiam o império romano e destruiam tudo que viam pela frente. Sem as bibliotecas monásticas da antiguidade tardia, uma parte considerável da cultura clássica teria se perdido.
O caso do monasticismo copta é elucidativo nesse sentido. As bibliotecas dos mosteiros coptas, ajudadas pelo clima seco do Egito, conservaram um número considerável de manuscritos, muitos deles, como visto em posts anteriores, ainda intocados e não editados. Não foi por acaso que o grande coptólogo W. E. Crum afirmou na primeira metade do século XX que todos os manuscritos e fragmentos coptas conhecidos até então provinham de uma biblioteca monástica. Os próprios manuscritos de Nag Hammadi parecem não fazer exceção à regra: a teoria segundo a qual eles derivam de uma biblioteca monástica do sul do Egito ganha cada vez mais força.

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Livros gratuitos da Society of Biblical Literature

Descobri recentemente que a SBL (Society of Biblical Literature) tem um projeto que visa popularizar e encorajar os estudos bíblicos nos países pobres; esse projeto consiste, basicamente, em disponibilizar on line e em pdf livros que a própria SBL publica. Pode-se fazer o download a partir de computadores que estejam em países com renda per capita menor que a dos EUA e dos principais países da UE. Como estou no Canadá, não posso fazer o download, portanto, não sei se funciona. Mas dei uma olhada rápida na lista de livros disponíveis e posso garantir que tem bastante coisa. Só não posso garantir que os livros sejam bons. De qualquer modo, parece-me que essa iniciativa é uma ajuda e tanto para quem não tem acesso fácil a boas bibliotecas. Fica a dica.
O site do projeto por ser acessado aqui
E a lista dos livros disponíveis pode ser acessada aqui

sábado, 2 de julho de 2011

Lista de links úteis

Disponibilizei no fim da página, lá em baixo, uma lista de links que julgo serem interessantes e úteis para quem se interessa pelo cristianismo primitivo. A lista visa facilitar a vida de quem quer conhecer mais sobre o cristianismo antigo por meio de sites e periódicos sérios e científicos. 
Está lista está longe de estar fechada; logo, se alguém tiver alguma sugestão de site, basta me avisar.

quarta-feira, 29 de junho de 2011

O trabalho de Alin Suciu com manuscritos coptas

Creio já ter dito nesse blog que a quantidade de manuscritos coptas que sobreviuveu até os dias de hoje é muito maior que a quantidade de estudiosos aptos e interessados em estudá-los. Esse, digamos, déficit faz com que existam dezenas, centenas de manuscritos e fragmentos coptas desconhecidos e não editados. Manuscritos e fragmentos que, muitas vezes, ficam esquecidos e enconstados em bibliotecas do mundo devido ao simples fato de não haver gente o suficiente que se interesse em estudá-los e editá-los.
Pois bem, o meu colega e amigo Alin Suciu teve acesso à base de dados de manuscritos e fragmentos coptas do professor italiano Tito Orlandi, base de dados essa que contém muitas, não sei exatamente quantas, fotos de manuscritos e fragmentos coptas. Na maioria dos casos, tratam-se de fotos de manuscritos e fragmentos que ainda não foram editados ou sequer identificados.
Enquanto prepara sua tese de doutorado, Alin Suciu tem conseguido identificar vários desses fragmentos; ele tem identificado outros testemunhos e/ou versões de textos já conhecidos. Talvez ele já tenha até encontrado algum fragmento ou manuscrito que contenha um texto inédito. Vale a pena conferir de perto o trabalho de Suciu em seu SITE, que, a partir de hoje, passa a constar nesse blog como um link permanente.
Quem sabe num futuro próximo, Suciu, contanto talvez com a ajuda de outros estudiosos, consiga editar alguns desses manuscritos e fragmentos. Eu mesmo já ofereci ajuda.

PS: atendendo a pedidos, resolvi aumentar o tamanho da fonte nas postangens.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Livro argentino sobre o Evangelho de Judas

Recentemente, chegou a mim um livro argentino sobre o Evangelho de Judas (Diego M. Santos e Pablo Ubierna. El Evangelio de Judas y otros textos gnósticos - tradiciones culturales en el monacato primitivo egipcio del siglo IV. Buenos Aires: Bergerac Ediciones, 2009).
O livro é interessante e aborda algumas questões interessantes, sem, no entanto, trazer nenhuma discussão inédita.
O que o livro tem de inédito são os novos fragmentos do Evangelho de Judas, sobre os quais falamos no post anterior. Este livro é a primeira publicação impressa, até onde sei, a disponilbilizar os fragmentos e ainda uma tradução; no caso, em espanhol.
É interessante notar que o livro data de 2009 e os fragmentos foram disponiblizados no site de Gregor Wurst no fim do mesmo ano. A inclusão do texto dos fragementos deve ter sido feita de última hora, portanto.  
Seria muito bom se pudéssemos começar a editar esse tipo de coisa no Brasil também. Talvez a idéia possa sair do papel em breve.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Mais sobre os novos fragmentos do Evangelho de Judas

Ano passado escrevi um post aqui no blog sobre os novos fragmentos do Evangelho de Judas.


Ontem, em um dos encontros semanais que temos aqui na Université Laval, o Seminário BCHN, o Prof. Louis Painchaud nos falou um pouco mais dos novos fragmentos do Evangelho de Judas, cujas fotos e reconstruções textuais estão disponíveis no site do Prof. Gregor Wurst desde janeiro desse ano (outros fragmentos do codex Tchacos também estão disponíveis):


A maioria desses novos fragmentos apenas confirma o preenchimento de algumas lacunas já proposto pelos editores. No entanto, alguns deles, como os das páginas 55/56 e 57/58 trazem novidades interessantes para a interpretação do texto. Como eu já havia dito no post do ano passado, o fragmento em específico das páginas 57/58 preenche uma lacuna importante, que se encontrava no meio do diálogo final entre os personagens de Judas Iscariotes e Jesus. O trecho em questão narra a ascensão de um dos dois personagens; mas por causa da lacuna, não se podia saber ao certo se quem subia aos céus era Jesus ou Judas. Com o novo fragmento, pode-se afirmar que quem sobe aos céus é Jesus; o novo fragmento pode ser traduzido da seguinte maneira: "E Judas parou de ver Jesus".
Ou seja, como Jesus subiu na nuvem e ascendeu aos céus, Judas não conseguiu mais vê-lo.
Com isso, a sugestão de que a ascensão em questão seria uma espécie de elevação final do personagem de Judas, uma exaltação, cai por terra de vez. Mas claro que vai aparecer gente dizendo o contrário....

O fato é que a interpretação inicial divulgada pela National Geographic e seus editores - segundo a qual o texto traria uma nova interpretação do episódio da traição de Jesus e uma consequente reabilitação de Judas - fica há cada dia mais insustentável. Alguns estudiosos, como o próprio Gregor Wurst, já voltaram atrás.

terça-feira, 29 de março de 2011

terça-feira, 25 de janeiro de 2011

O Apocalipse copta de Paulo e o corpus paulino no século II

Seguindo a linha do post anterior, já que hoje a liturgia latina celebra a conversão de São Paulo, aí vai um post sobre um pouco do legado literário do "Apóstolo das Gentes". 

É sabido que as epístolas compostas por Paulo (sem entrar na discussão das chamadas epístolas deuteropaulinas), todas nas décadas de 50 e 60 do séc. I, eram endereçadas a comunidades ou pessoas em específico; logo, em princípio, elas visavam resolver problemas grosso modo pontuais, em geral peculiares àquelas comunidades as quais cada uma das epístolas era endereçada. No entanto, com o o tempo, essas epístolas, que em princípio foram endereçadas a comunidades específicas, deixaram de ser patrimônio único das comunidades em questão e passaram a ser utilizadas e respeitadas por toda a cristandade. É provável, inclusive, que a partir de um determinado momento, os cristãos passaram a se utilizar de conjuntos de epístolas paulinas que não circulavam mais separadamente, mas juntas, numa espécie de corpus paulino. É provável que isso tenha demandado certo tempo para começar a acontecer, se levarmos em conta a dinâmica de difusão e consumo de textos na antiguidade. Seria praticamente impossível fixar uma data exata de quando isso começou a acontecer, mas antes do séc. II seria muito pouco provável.

Enfim, é aí que entra o Apocalipse copta de Paulo (NH V, 2), também conhecido como ApocPaulo de Nag Hammadi e que não deve ser confundido com o mais conhecido, porém, mais tardio, Apocalipse Latino de Paulo; trata-se de um texto seguramente pseudonímico, composto na segunda metade do século II, provavelmente em grego. O texto nos relata uma ascensão de Paulo, provavelmente beseada no relato de 2 Coríntios. Mas além de fazer referência clara ao episódio de 2Cor 12, 2, o nosso Apocalipse de Paulo faz alusões a outros textos do corpus paulino, como Romanos, Galatas e Efésios. 
Isso demonstra que, muito provavelmente, o autor do Apocalipse de Paulo tinha conhecimento não apenas de 1 epístola paulina, mas de várias, um argumento em favor da existência de um corpus paulino já na segunda metade do século II.
Deixando de lado o conteúdo propriamente dito do texto, vale dizer que ele é particularmente interessante para o estudo da difusão e do consumo do Novo Testamento na antiguidade. 
Posso estar enganado, mas proporcionalmente - o Apocalipse de Paulo é pequenho, cerca de 6 páginas e meia - o texto em questão deve ser um dos que mais faz alusões a epístolas paulinas no século II.  

segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Santo Antão

Hoja a liturgia romana comemora a festa de Santo Antão, anacoreta egípcio que é conhecido como "pai dos monges".
De início, gostaria de dizer que acho esquisito chamarmos esse santo de "Antão", visto que tanto em grego quanto em copta seu nome é Antonios. Em inglês e em francês ele é chamado respectivamente de "Antony" e "Antoine", ambos equivalentes do português "Antônio". Enfim, não sei até hoje porque o chamamos de "Antão".
Antão nasceu na segunda metade do século III e viveu até a primeira metade do séc. IV. Provavelmente tinha o copta como sua língua materna. Ainda jovem, resolveu se refugiar no deserto egípcio vivendo como anacoreta. Ele não foi o primeiro a fazer isso, mas foi com certeza o que ganhou mais notoriedade. Era visto como santo e possuidor de carismas de clarividência já por seus contemporâneos. Ele ficou especialmente famoso porque Atanásio de Alexandria escreveu sua biografia, a chamada Vida e conduta de Santo Antão. A Obra influenciou bastante a mentalidade monástica cristã, tanto a ocidental quanto a oriental.
Antão é o exemplo mais conhecido de um fenômeno que começou a se espalhar no cristianismo oriental, principalmente a partir do séc. IV e em especial no Egito: pessoas, principalmente provenientes do campo, que deixavam o convívio social e passavam a viver no deserto ou em cavernas como anacoretas. Logo surgiram também aqueles que viviam uma vida de ascese extrema, mas em grupo, submetidos a uma regra comum, os primeiros monges cenobitas, também no Egito no séc. IV.
O monasticismo, seja ele anacoreta ou cenobita, passou a ser visto como uma espécie de "novo martírio", em uma época na qual não havia mais perseguições institucionais aos cristãos (a partir do início do séc. IV). O monge, então, era visto como aquele que morria para o mundo, passando a viver isoladamente.
O monasticismo é muita vezes visto pelo senso comum como um fenômeno medieval, mas o fato é que ele surgiu na antiguidade e deve, portanto, estar inserido nos estudos e reflexões relativos ao cristianismo primitivo. É interessante notar, por exemplo, que muitos dos manuscritos antigos orientais pertenceram a bibliotecas monásticas.
A quantidade de anacoretas e monges cenobitas no Egito do séc. IV não pode ser precisada, mas com certeza era grande, a ponto de Atanásio dizer que os que seguiram o exemplo de Antão eram tantos que "o deserto tornou-se uma cidade".