sexta-feira, 20 de junho de 2008

Apócrifos II

Bom, acho que hoje poderiamos falar um pouco da pseudonímia, um recurso literário utilizado largamente na Antiguidade.
A pseudonímia consistia no seguinte, um autor qualquer, ávido por delegar autoridade a seu texto e a sua mensagem, atribuía sua autoria a uma figura importante do passado. Explicando na prática: Se um "Zé Mané" qualquer escrevesse um "evangelho", por exemplo, e colocasse como título Evangelho segundo Zé Mané, ninguém daria crédito a obra. Mas se o nosso querido "Zé Mané" desse a seu texto o nome de um apóstolo ou discípulo de Jesus, por exemplo, a coisa mudaria de figura. Por isso temos tantos "evangelhos" com nomes de apóstolos e outros textos de gêneros literários distintos atribuídos a diversas figuras importantes do cristianismo e/ou judaísmo antigos.
Por isso, temos textos como o evangelho de Tomé, ou o evangelho de Maria, ou o apocalipse de Paulo. É obvio que estes textos não foram escritos pelos personagens em questão, mesmo porque datam da segunda metade do séc. II, mais de 100 anos após a época em que eles viveram. Tratam-se de exemplos claros de pseudonímia.
Mas não se deve encarar a pseudonímia como uma éspecie de fraude; ela era na antiguidade um artifício, uma prática literária, usado por autores de diferentes religiões e de diferentes etinias e em gêneros literários diversos.
No caso dos "apócrifos", eu ousaria dizer que a totalidade dos textos que chegaram até nós são pseudonímicos.
Aproveito para agradecer a Andrea; ela tem participado com frequência. Obrigado, Andrea! Que seus comentários encoragem outros a participar.

terça-feira, 10 de junho de 2008

Os Apócrifos.....

Os chamados “livros apócrifos” têm chamado à atenção tanto do grande público quanto de estudiosos de áreas ligadas à história da Bíblia nos últimos tempos. A quantidade de informações disponíveis nos mais diversos meios de comunicação e até mesmo em livros pretensamente acadêmicos é considerável, sua qualidade e veracidade são, no entanto, questionáveis.
Para o grande público, o tema parece ser potencialmente polêmico, pois a idéia geral propagada sobre os apócrifos versa que eles seriam livros secretos que conteriam os verdadeiros ensinamentos e a verdadeira história de Jesus e seus primeiros discípulos; tal polêmica é ainda reforçada pela idéia segundo a qual a Igreja teria, desde muito cedo, escondido e condenado os apócrifos como forma de instituir e reforçar seu poder e dominação sobre os cristãos, já que os tais apócrifos conteriam doutrinas “subversivas” que não permitiriam a dominação em questão. Alguns livros pseudocientíficos e jornalistas pouco preocupados com a verdade vão além, dizendo que muitos desses livros, apesar da proibição eclesiástica, teriam sido conservados por sociedades ou seitas secretas, como os chamados gnósticos, os “verdadeiros detentores do ensinamento original de Cristo”; e teria sido por meio desses gnósticos e de membros de outras sociedades secretas, que seriam hoje representados por seitas esotéricas e “Nova Era”, que os livros apócrifos teriam chegado até nós.
Tudo isso é muito polêmico, mas não passa de ficção ou simples distorção da realidade. De fato, o vocábulo grego que dá origem à palavra “apócrifo” significa “livro secreto”, mas o conceito que se aplica a tal palavra hoje em dia não corresponde necessariamente a isso. Antes de tudo, deve-se enfatizar que o conceito acadêmico de “apócrifo” é extremamente elástico e volátil; a primeira característica que se atribui comumente a um apócrifo diz respeito ao fato de ele ser um texto que não pertence ao Cânon, ou seja, um texto que não faz parte dos livros que integram a Bíblia cristã. Tal característica não é, no entanto, abrangente o suficiente, pois vários textos antigos não são canônicos e nem por isso são considerados apócrifos (as Confissões de Santo Agostinho, por exemplo, não fazem parte do Cânon e nem por isso a obra em questão é considerada um apócrifo; e o mesmo valeria para centenas de outras obras da antiguidade). O que seria um apócrifo então?
Bom, a tentativa de resposta dessa pergunta fica para o post da semana que vem.
Aproveito para agradecer o comentário da Rafaela, aluna da Wizard. Obrigado Rafaela, e lembre-se que você é sempre bem vinda por aqui.